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ANDREA BOCELLI “A realidade superou muito os meus sonhos”

ANDREA BOCELLI “A realidade superou muito os meus sonhos”

Por Michele Marreira  |  Foto: Mark Seliger

O tenor que encanta multidões escolheu o Brasil para apresentar sua nova turnê que leva o nome de “Si”, projeto musical que traz 16 faixas inéditas, após um hiato de 14 anos. Nas quatro apresentações que realizou por aqui, uma curiosidade chamou a atenção do astro mundial; o fato do público de Porto Alegre permanecer intacto apesar do dilúvio que atingia o Estádio Beira-Rio na ocasião. “Eu teria ido embora”, brincou, durante a entrevista. Outro motivo que o animou foi o privilégio de celebrar seus 60 anos de idade em solo brasileiro. 

Andrea Bocelli é natural da cidade de Lajatico, região da Itália. Aos seis anos, já mostrava aptidão por instrumentos musicais, tais como, piano, flauta, saxofone, trompete, harpa, órgão, violão e bateria. E que musicista! O canto sempre esteve presente em sua vida. Porém, ao concluir o Ensino Médio, ingressou no curso de Direito na Universidade de Pisa. 

O artista nasceu com glaucoma congênito. Aos 12 anos, sofreu um grave acidente durante uma partida de futebol ao levar uma forte bolada na cabeça, fazendo com que sua cegueira fosse total. Superando todas as expectativas, tornou-se um dos ícones da musical erudita, democratizando-a mundo a fora. Com mais de 70 milhões de cópias vendidas, coleciona inúmeros sucessos com seus álbuns clássicos e populares lançados em quase três décadas de carreira. 

Sua voz imponente surpreende pela extensão de notas que entoa por um longo período, seguido, além de encantar o ouvinte pelo sentimento que o intérprete transmite. Os singles “Com Te Partiró”, “Vivo Por Ella”, “Canto Della Terra”, “The Prayer”, são apenas alguns dos grandes sucessos no extenso currículo do cantor. 

Casado com a empresária Veronica Berti e pai de três filhos, Matteo, Amos e Virginia, faz questão de priorizar o convívio familiar acima de qualquer compromisso profissional. Realizamos uma entrevista para lá de especial com este exímio tenor que é super engajado em causas sociais, fundando inclusive um instituto em seu país de origem. Deleite-se! 

Revista Total: Há 14 anos que você não divulgava um álbum de inéditas. Qual o sentimento de lançá-lo mundialmente?

Andrea Bocelli: Queria voltar às memórias; de ser um jovem tocando piano em um bar. Obviamente, de lá para cá, eu produzi muitos discos, cantei muitos covers e apresentei várias outras canções. Mas em determinado ponto disse a mim mesmo: “Talvez seja a hora de direcionar meu foco em encontrar novas músicas”. É como recomeçar em minha carreira. 

Como surgiu a escolha do título do Cd, “Si”?

Estávamos procurando um título para o álbum, trocávamos algumas sugestões, ninguém sabia ao certo como chamaria. Até que meu filho sugeriu que colocássemos “Si”. Concordei. É a palavra mais bonita do vocabulário. Quando damos um beijo, um abraço ou pedimos perdão, usamos essa palavra, que é bonita e poética. Neste período histórico pelo qual estamos passando, nós estamos acostumados a dizer ‘não’ com frequência. “Si” é uma expressão positiva, poderosa e humana, um sentimento que provoca emoção. 

Vira e mexe você vem ao Brasil. Qual sua ligação com o país?

Passar pelo Brasil faz-me lembrar das vezes que eu cantava músicas brasileiras em piano-bar [no início de sua carreira]. Sempre existem boas razões para retornar. É um público afetuoso. Quero voltar mais vezes!

O que mais te chamou atenção nas cidades em que se apresentou em solo brasileiro?

Queria falar de um episódio. Fiz um concerto em Porto Alegre num estádio aberto [Beira-Rio]. De repente começou a chover e chover muito! O show iniciou com bastante água, todas as pessoas permaneceram. E se elas ficaram é porque gostam muito do meu trabalho, eu, por exemplo, teria saído (risos). Em São Paulo teve uma boa atmosfera no ponto de vista climático. Dei o melhor de mim em todos os concertos. 

De que maneira foi realizada a escolha da orquestra e coral do Instituto Bacarelli, localizado na Comunidade de Heliópolis (SP), para acompanhá-lo em suas apresentações no Brasil?

Eu não os conhecia quando me foram sugeridos o coral e a orquestra. Foi algo extraordinário. São jovens com experiência de vida difícil, que tocam muito bem, com paixão e emoção. 

Por falar em projetos sociais conte-nos um pouco sobre o instituto que leva seu nome, na Itália. 

A Andrea Bocelli Foundation desenvolve um trabalho social bastante conhecido. Era um grande desejo meu, de minha esposa Verônica, de nossa família, proporcionar um futuro melhor para pessoas que não tiveram a mesma sorte que eu tive na vida. Em pouco tempo, desde 2011, conseguimos alcançar grandes objetivos. As pessoas que não têm condições de desenvolver talentos individualmente ou coletivamente, contam com a ajuda da Fundação, para que possam alcançar esses sonhos. Nesse sentindo trabalhamos muito com o ensino, seja na Itália ou fora. Construímos cinco escolas que estão funcionando com 2550 crianças, estudantes do Ensino Fundamental. E em algumas comunidades remotas fornecemos água potável que é fundamental e importante para que não haja o desenvolvimento de doenças. Oferecemos também assistência médica dando-lhes um futuro melhor referente à saúde deles. Recentemente tivemos um terremoto avassalador na Itália com muitas cidades destruídas. Em 150 dias reconstruímos uma escola local de Ensino Fundamental com a máxima tecnologia e a devolvemos à cidade. 

Cantores do mundo inteiro sonham em fazer um dueto com você. Como descreve essas parcerias?

Conheço a música brasileira desde pequeno. Já fiz dueto com Sandy, Toquinho, dentre outros. É uma relação muito forte! Cada dueto tem a sua história. Com Celine Dion nasceu através da canção The Prayer. Alguns artistas são oferecidos pelas gravadoras. E outros pela vontade do próprio artista ao me procurar. É um modo de enriquecer, algo que me agrada muito. É um patrimônio que recebo, pois cada um desses artistas traz algo novo para que possamos realizar um bom trabalho juntos.

Já se passou mais de 20 anos desde que você lançou o CD Romanzza no Brasil, com a participação da cantora Sandy. O que mudou na sua carreira de lá para cá? 

Mudou a cor dos meus cabelos e minha conta bancária (risos). Eu fico contente, claro. A realidade superou muito os meus sonhos. Minha essência não mudou, nem a relação com os meus amigos. 

Qual o sentimento em ser um dos responsáveis pela popularização da ópera?

A história da ópera começou em 1500 como um estilo de música popular, nascido na Itália, um fenômeno de música popular. Posteriormente ela tornou-se uma música de elite. Quem não se lembra de Caruso, entre outros? Todos eles faziam música popular, antes e melhor do que eu. A ópera eleva as pessoas a um lugar mais alto. 

Como fã ávido de futebol, qual a semelhança entre este esporte e a ópera?

Incomum é o aspecto atlético desses dois mundos. As pregas vocais são músculos. Na hora em que cantamos a ópera ela precisa ultrapassar o palco. No teatro não há amplificação, precisamos ser verdadeiros atletas. Certa vez fui cantar Madame Buttefly, de Puccini. Tinha que carregar a soprano até à cama cantando [a nota] dó agudo!

E qual o papel da música em tempos de crise política mundial?

É um tema complexo. Mas, a música serve para nos dar um pouco de leveza, para que possamos sair da nossa rotina que é ligada ao dinheiro e tantas outras coisas.  

Tags: Especial


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